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'Ultra-atletas' de mais de 60 anos testam limites do corpo

Uma torturante maratona de bicicleta pelas montanhas da Suíça não é um jeito muito comum de se celebrar um aniversário de 61 anos.

"Eu jurei que nunca faria algo assim – é tão longo e cruel, com tanta dor", diz Sunny McKee. Mas mesmo assim ela acabou competindo no campeonato de Ironman, fazendo 180 quilômetros de bicicleta e quatro quilômetros de nado. Tudo no mesmo dia.

McKee não se intimida com exercícios intensos. Ela compete em triatlos e outros desafios do gênero há 30 anos. Em 2007, começou a participar de eventos de alta resistência, depois de ver uma pessoa com dois membros amputados terminar uma competição. A prótese da perna acabou a prova enxarcada em suor.

"Se alguém assim consegue, então alguém como eu também pode", disse ela.

Ironman na terceira idade

Hoje, aos 65 anos, ela está viciada no Ironman. Em outubro, participou sem nenhum problema. "Eu tenho mais energia que meus filhos e netos", conta.

Há algumas décadas, esses exercícios intensos em idade já avançada seriam impensáveis. Mas recentemente é cada vez mais comum ver pessoas da terceira idade em eventos como o Ironman. Como é possível?

As competições de alta resistência variam de acordo com distâncias e modalidades, mas em geral elas duram um mínimo de seis horas. Quando surgiram nos anos 1970, muitos médicos temiam que as provas seriam uma agressão ao corpo, apresentando perigos para a saúde.

"Alta resistência é um desafio cardiovascular gigantesco", diz Keith George, da Universidade Liverpool John Moores. "Em geral, não temos centenas de pessoas internadas depois dessas provas."

Exames de sangue feitos com os participantes sugerem que não há motivos para se preocupar. Apesar de sempre existir um risco entre algumas pessoas, George acredita que quem treina do jeito certo está seguro.

"Dificilmente alguém vai provocar um infarto em si mesmo com corridas intensas se ela já não tiver alguma doença cardíaca prévia", diz.

Cérebro 'sugado'

Pessoas que fazem esportes de alta resistência por um período prolongado também não apresentaram nenhum dano de longo prazo, como desgaste de ligamentos ou de tecidos próximos ao coração.

Curiosamente, a parte do corpo que mais sofre é o cérebro. Um estudo feito a partir de várias ressonâncias magnéticas com atletas de competições assim – de todas as idades – mostrou que a massa cinzenta pode se reduzir em até 6% durante provas intensas.

"É uma perda muito profunda", diz Wolfgang Freund, da Ulm University Hospital, na Alemanha. Mas o estudo mostrou que essa massa cerebral se recupera ao longo de alguns meses.

A hipótese levantada pelo médico é de que o resto do corpo "suga" todos os nutrientes do cérebro para ajudar nas competições.

Outra pesquisa conduzida pelo médico Beat Knechtle, da Universidade de Zurique, mostrou que o corpo dos atletas não sofre um grande declínio de desempenho depois dos 50 anos.

É verdade que a grande maioria dos vencedores da prova tem menos de 44 anos. Mas mesmo atletas com mais de 50 anos possuem desempenho satisfatório nas provas.

"O corpo humano é algo fantástico e continua podendo ser treinado durante toda a vida", diz George. "As pessoas podem acabar correndo mais devagar ou demorar mais para se recuperar, mas não existe necessidade de parar depois de certa idade, até onde eu sei."

Vantagens da velhice

McKee diz que a idade pode até ser uma vantagem em algumas circunstâncias. Ela conta já ter presenciado muitos atletas jovens que começam muito cedo em competições como o Ironman acabarem desistindo. Já a experiência acumulada de anos em outros esportes dão a McKee mais noção dos limites do próprio corpo.

A idade também traz maior inteligência emocional, e o segredo para ser bem-sucedido em provas intensas é treinar a resistência mental tanto quanto o preparo físico.

Em algumas provas, como a Race Across America, um percurso cruzando 4,8 mil quilômetros de um litoral ao outro dos Estados Unidos em dez dias, os competidores têm pouco tempo para dormir. Isso provoca variações brutais de humor, que muitos competidores jovens não suportam.

"Às vezes você está tão cansado que sente que não vai conseguir ficar acordado – mas acaba descobrindo que consegue pedalar por mais seis horas", conta Valerio Zamboni, de 60 anos, que já participou da corrida americana.

Esses dados levam muitos especialistas a pedir que os governos repensem suas atitudes em relação à saúde pública. Segundo estatísticas americanas, mais da metade das pessoas com mais de 65 anos não praticam nenhuma atividade física. E apenas 40% atendem às recomendações modestas feitas pelas autoridades.

Os médicos esperam que a experiência de pessoas como McKee e Zamboni mostrem que o corpo humano pode continuar sendo testado fisicamente mesmo após os 60 anos.

Fonte: BBC



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