A aprendizagem dos esportes coletivos
Ao escrever sobre a iniciação desportiva, lembramos que a preocupação sobre esse tema não é recente, pois na década de 70, encontramos boa bibliografia de autores estrangeiros sobre o assunto e na década de 80, essa preocupação passou, também, a ter eco entre os autores nacionais. Apesar disso, essas preocupações, que indicavam sobre a necessidade de se atentar sobre diversos aspectos relativos ao crescimento e desenvolvimento da criança, parece não ter sido resolvida a contento na atualidade, sendo motivo de novas preocupações. Uma delas surge sob o aspecto de super valorização que o esporte competitivo vem adquirindo na sociedade moderna, devido a noção de sucesso que representa, não só a nível desportivo, como também, financeiro e social e político, tendo como uma das conseqüência mais marcante a iniciação precoce ao treinamento desportivo infantil. Centramos o tema na Escola, porque a iniciação desportiva ocorre normalmente numa faixa etária entre 7/8 e 13/14 anos de idade, período esse, que corresponde ao da jornada escolar do 1° Grau, cuja principal característica, está marcada pelas diferentes necessidades e interesses que as crianças apresentam, à medida que se avança nessas idades.
Ainda com o objetivo de estabelecer os limites deste estudo, vamos abordar a temática "iniciação desportiva" no espaço dos Esportes Coletivos, devido à dificuldade existente nas escolas para o desenvolvimento de desportos individuais (natação, atletismo, esgrima, ginástica de solo, rítmica, etc.) e, por ser a atividade coletiva, mais observada nas aulas de Educação Física dentro das escolas.
Ao centrarmos nosso estudo na Escola, torna-se necessário uma breve discussão sobre a função da Educação Física e do Desporto no âmbito escolar, para situarmos nossa posição à respeito do assunto.
A Educação Física é tomada constantemente como sinônimo de Esporte e, seus protagonistas - professores - alunos / técnicos - atletas - tendem, também a ser incluídos nessa confusão, sendo, o Professor de Educação Física, freqüentemente, instado a assumir a posição do Técnico Esportivo, devido a essa indefinição.
Para esclarecermos o que queremos dizer, vamos considerar o Professor de Educação Física, como o profissional que preocupa-se com a qualidade de vida dos alunos, com destaque para o aspecto educacional/formativo, utilizando-se para isso, atividades regulares, equilibradas, adequadas, cuja intencionalidade visa o bem estar, a saúde e o equilíbrio mental e social das crianças, no meio em que vive (contexto social); e mais, segundo Ghiraldelli (1989), o professor de Educação Física deve também, exercer a função de socializador da cultura erudita, de forma que sua aula venha a transformar-se num ambiente de riqueza cultural onde se estabeleça um trampolim para a crítica; quanto ao Técnico Esportivo, o consideraremos como o profissional responsável pela qualidade desportiva dos atletas, onde autores como Betti (1988) e Maris de Oliveira (1988), consideram como pressupostos básicos para a intencionalidade da atividade motora - representada pela a competição e pelo treinamento exaustivo - o desempenho, a motivação extrínseca e a inflexibilidade das regras, colocados em confrontos para averiguação da performance desportiva.
Por fim, definindo a abrangência de nosso ensaio, lançaremos mão de Piaget, que nos ensina que a partir de sete/oito anos pode-se iniciar o jogo com regras, portanto, a iniciação desportiva. Mas, indica também, que as bases nas quais se assenta os Esportes Coletivos, que são a cooperação/colaboração e o respeito às regras, só aparecerão por volta dos dez anos de idade, quando esses princípios de camaradagem, de desportividade e solidariedade, passam a ter significado na vida da criança.
Ainda nos reportando à Piaget, vamos alertar nosso professor que quer conduzir com segurança a aprendizagem de seus alunos, que "o conhecimento não pode ser dado às crianças. Ele tem que ser descoberto e reconstruído através das atividades dos alunos" (in CHARLES, 1975, p.4), com tempo suficiente para que o conhecimento possa ser assimilado e os processos mentais, o acomodem, para ser utilizado posteriormente.
Se objetivarmos a formação de alunos que venham a gostar de Esportes como forma de satisfação pessoal, torna-se necessário, por um lado, uma planificação criteriosa para atingirmos nossos objetivos seguramente, com ações concretas e coerentes em nossa atuação pedagógica e, por outro lado, lançar um alerta para os resultados rápidos no que tange à obtenção de performances desportivas em crianças em formação.
Começando a aprendizagem na faixa etária dos sete/oito anos, observando suas particularidades e especificidade, para depois, só após os doze/treze anos, iniciarmos essas crianças no treinamento desportivo, estaremos contribuindo para o desenvolvimento dos esporte coletivos, que ocupam um lugar de destaque no cenário desportivo de nosso país e, em particular, no âmbito do desporto escolar.
Assim, para uma melhor visualização do enunciado, faremos uma divisão didática de nosso planejamento em três momentos que estão sintetizados no quadro a seguir:
E S T A G I O S
e I D A D E S *
O B J E T I V O S
F O R M A S d e
T R A B A L H O.
iniciação desportiva
(08 e 09 anos)
- aquisição de habilidades motoras e destrezas - específicas e globais
- formas básicas de movimentos e de jogos pré-desportivos
aperfeiçoamento desportivo
(10 e 11 anos)
- introdução aos elementos técnicos fundamentais e táticas gerais / regras
- educativos e contestes / práticas desportiva com regras
introdução ao treinamento
(12 e 13 anos)
- aperfeiçoamento das técnicas individuais / Sistemas táticos / aquisição qualidades físicas
- preparação física, técnica e tática / Prática Desportiva Orientada
* Os limites de idades contempladas neste quadro, não são rígidas, podendo variar de acordo com a maturidade física e mental de cada criança.
INICIAÇÃO DESPORTIVA
IDADE DE 7/8 e 9 ANOS
Nessa fase, as aula de Educação Física devem assumir as características de um grande espaço interativo, onde as ações e brincadeiras permitam que as crianças tenham liberdade para criar, inventar, errar e reaprender.
Mas, o professor não deve esquecer a função de educador/orientador. Deve distinguir-se do recreador/animador, pois sua função é a ação pedagógica, assumindo portanto, "responsabilidades pedagógicas pelo presente e pelo futuro das crianças que lhe são confiadas"(BENTO, 1989, p.9).
Neste caso - Iniciação Desportiva - é conveniente saber quais as estruturas intervenientes nesse estágio de aprendizagem para poder estruturar as atividades a serem desenvolvidas.
Do ponto de vista psicossocial, Piaget, conforme já explicitado, indica que nessa idade a criança já encontra-se apta para a aprendizagem inicial dos desportos, pois já participa de atividades que utilizam regras, porém, ainda não está apta para o jogo coletivo de competição. Isso significa dizer, que na idade de 7/8 anos, o esporte coletivo exerce fascínio nas crianças, muito mais pelo prazer da atividade e da coletividade (estar junto) do que pelo próprio jogo (competição). Isso se deve ao fato delas estarem ainda muito voltadas para si próprias (egocêntricas). A criança nessa idade não joga contra o outro, ela joga para si mesma. Com isso, o professor, deve ficar atento nas atividades que envolvem a formação de grupos (com ou sem bola), pois essas ações grupais, essenciais para o jogo coletivo, poderão não atingir sua plenitude, principalmente no início dessa fase.
Além disso, as atividades esportivas coletivas, tem na bola, seu objeto de realização. Na idade que estipulamos para introduzirmos as crianças na aprendizagem desportiva (7/8 anos), a bola, torna-se, também, objeto de prazer e, sua posse, passa a ser um fator de (des)motivação e (des)interesse para os quais o professor deve estar sempre atento.
Exemplificando o que foi dito, vejamos uma situação que ocorre freqüentemente no Handebol e no Basquete: - por ocasião da ação ofensiva, sob o prisma do jogo adulto, é comum apenas um ou dois elementos conduzirem a bola para a zona ofensiva e os demais elementos da equipe dirigem-se para uma posição previamente marcada da quadra. Pelo exposto anteriormente, se for oferecido às crianças uma atividade nos moldes que reproduzem o desporto formal, adulto, as crianças na faixa etária compreendida pela Iniciação Desportiva, que não estiverem participando ativamente dessa ação (condução e distribuição da bola/objeto de prazer), tenderão a dispersar-se e poderão não atuar como um todo, como uma equipe. Essa dispersão tende a se repetir por ocasião do retorno (sem bola) para sua linha defensiva, pelo fato da criança ter que se distanciar do objeto mais importante da atividade, a bola.
Outro fato que ocorre freqüentemente por ocasião da prática desportiva coletiva, ainda nessa idade, é a aglutinação de muitas crianças em torno da bola, independente da situação do jogo, ou seja, se estão defendendo ou atacando. O importante é a posse ou a defesa do objeto do prazer, caracterizado pela bola. Dessa situação, decorrem outras, como por exemplo, crianças que conseguem apossar-se da bola, a monopolizam até sua perda (retomada de posse por outra criança), sem que isso cause qualquer constrangimento pelo prejuízo que isso possa representar para sua equipe.
A incompreensão de tais atitudes por parte do professor, pode levá-lo a interromper a atividade e determinar o "restabelecimento da ordem", com cada aluno em seu devido lugar (previamente marcado) ou para que o aluno se recorde sempre do princípio coletivo do jogo, onde a bola deve ser conduzida através de passes sucessivos entre os companheiros.
Tal reação do professor diante desses fatos, pode torna-se incompreensível para a criança, que realiza a atividade (jogo) pelo prazer que essa atividade pode lhe proporcionar sem, portanto, competir, ou mesmo, atuar com o outro e, sem ter a compreensão exata das regras (adultas) que determinam a atuação cooperativa na qual se baseia o jogo coletivo. Ao ver-se cerceada em sua ação (prazerosa, na busca ou posse do objeto cobiçado), tende a desinteressar-se pela atividade que não lhe traz prazer.
Esse egocentrismo começa a regredir progressivamente a partir de sete, oito anos dando lugar aos processos de interação com o outro, através de ações coordenadas; inicia-se, também, a necessidade de conectar suas idéias com a dos outros, através de uma justificação lógica, ou seja, "a criança pensa antes de agir, começando, assim, a conquista desse processo difícil que é a reflexão" (Piaget, 1980, p.44).
O desenvolvimento desses processos vai permitir à criança, socializar-se, pois começa a se preocupar com o outro, a se colocar no lugar do outro (ressente-se profundamente, por exemplo, pela punição do grupo por causa da culpa de alguns), experimentando sensações de respeito pelo outro e, por volta dos 9/10 anos, sente o desejo de participação coletiva, seja no jogo ou num grupo social (grupinho). "Elas vêem umas às outras sob uma nova luz - à luz da posição social" (Piaget, in Charles, 1975, p.21), num processo que irá atingir o seu ápice por volta dos doze, treze anos de idade.
O professor, de posse desse conhecimento, tem possibilidade de planejar seu trabalho, de forma a torná-lo interessante e motivador, baseado em atividades lúdicas e recreativas, na busca de um aprendizado objetivo, eficiente e pouco monótono.
Assim, a estrutura da aula a ser oferecida para esta faixa de idade, deveria levar em conta que o aluno apresenta grande entusiasmo e precipitação (arrebatamento), porém, pouca força para a execução de atividades físicas e pouca capacidade de se concentrar por longos períodos de tempo (segundo Piaget), devido a grande necessidade (quantitativa e qualitativa) de movimento que caracteriza essa faixa etária (segundo Weineck). Portanto, as atividades planejadas deveriam ser bastante diversificadas e conter poucas informações teóricas a serem assimiladas, além de incorporar elementos de muita movimentação e pouca força. Não necessitariam, também, estar exclusivamente centradas em um único esporte, pois as habilidades básicas necessárias para um determinado esporte, podem ser desenvolvidas com o apoio de outros desportos.
O ideal, nessa fase, é portanto, oferecer um grande número de oportunidades para o desenvolvimento das mais variadas formas de habilidades motoras, pois se proporcionarmos a esse aluno, experiências motoras em corridas, equilíbrio, lançamentos, saltos, etc., estaremos instrumentalizando-o com qualidades motoras que poderão ser utilizadas em todos os desportos coletivos.
Lembrando que as crianças aprendem melhor partindo de experiências concretas, as atividades a serem oferecidas para oportunizar o vivenciamento dessas habilidades, deveriam ser de atividades lúdicas, com ou sem bola, tais como piques (que incluem uma variedade muito grande de tipos, com muitas mudanças de direção, com formação de grupos, etc.), brincadeiras de correr (estafetas diversos), de saltar (sobre diferentes objetos - mochilas, pequenos obstáculos naturais, plintos, etc.), de lançar (tiros ao alvo com objetos de tamanhos variados) e de brincadeiras que combinem esses fundamentos.
A utilização da bola para o desenvolvimento dessas habilidades, como por exemplo, apanhar a bola em diferentes planos (rolando, alta, meia-altura, etc.), lançá-la (em movimento ou parado) contra diferentes alvos (móveis ou fixos), por requerer também, um certo número de habilidades técnicas, vai proporcionar um aumento qualitativo das habilidades motoras.
Uma sessão de aula nesta faixa etária deveria levar em conta essas particularidades, não sendo, portanto, muito prolongada, onde se buscaria no aquecimento variadas formas de piques e brincadeiras, na aula propriamente dita, os contestes devem ser a base de toda a atividade, os educativos seriam realizados como atividade de aprendizagem dos contestes, ou seja, a movimentação dos contestes realizados sem o intuito da competição, buscando-se nessas atividades, o desenvolvimento e a ampliação das habilidades gerais e dos fundamentos de básicos dos esportes coletivos, tais como, deslocamentos diversos (pela quadra), passes, recepções, dribles (do handebol), chutes e lançamentos e, sempre concluir a aula com atividades prazerosas. Lembrar sempre que a hora do jogo, do conteste, é a hora da criança, onde a aprendizagem abre mão para a motivação e extravasamento, onde o professor deve apresentar-se o menos possível, só interferindo para facilitar, para agilizar, não para ensinar.
APERFEIÇOAMENTO DESPORTIVO
IDADE DE 10 e 11 ANOS
No decorrer desse processo, por volta dos dez, onze anos, a criança já experimenta e participa plenamente de ações baseadas na cooperação e colaboração. Ocorre, também nessa ocasião, a valorização do fator moral que envolve esse processo e as regras sociais devem ser seguidas à risca.
Neste caso, o jogo assume aspecto sócio/desportivo, onde seus participantes interagem, cada qual desempenhando um papel definido a ser cumprido (valores), sejam eles adversários ou companheiros, e as regras são os parâmetros pelas quais as ações são realizadas e julgadas. Os adversários caso mantenham sua atuação dentro das regras do jogo, são tolerados. Mas, no caso dos companheiros, outros valores são incluídos nesse julgamento, por exemplo: se o companheiro esta se dedicando ao jogo e produzindo positivamente para a equipe (colaboração e cooperação), ele é apreciado, em caso contrário, ele recebe uma forte cobrança, podendo ser alvo de sentimentos de rejeição e segregação.
Neste caso, torna-se importante a ação do educador, informando às crianças o "...significado das condições individuais como pressuposto e fator co-determinante do rendimento desportivo" (BENTO, op. cit., p.21), procurando estabelecer os limites das ações, visando preservar alunos que ainda não alcançaram a maturidade motora para o trabalho proposto, de forma que possam atuar na aula sem pressões ou amenizando essas pressões e a discriminação. Por exemplo, um fator que se apresenta freqüentemente nessa faixa de idade e, nem sempre é levada em conta, é a deficiência motora sob a forma de coordenação, quer para colocar grandes grupos musculares em ação para executar um recebimento de bola, ou um lançamento coordenado com corrida, ou simplesmente, um rápido deslocamento para fintar um adversário; isso implica em dificuldades de performance desportiva.
Essa dificuldade pode acompanhá-lo até os doze, treze anos e torna-se mais ou menos evidente, dependendo da qualidade dos trabalhos realizados para o desenvolvimento das habilidades motoras, em idades anteriores. O conhecimento sobre esse fato, segundo BENTO (op. cit.) "...pode ajudar a [...] fomentar a compreensão para o outro e, a cooperação, a resolver os conflitos de tipo individual e social"(p.22), evitando da parte dos outros, os sentimentos de rejeição explicitado anteriormente e a influenciar positivamente a imagem de si próprio
Mas, nessa faixa etária, as crianças já possuem certos padrões de comportamento que permitem a utilização de procedimentos pedagógicos mais complexos, pois essa situação passa a ser exigida pelas próprias crianças. É considerada uma faixa etária excelente para aprender.
A lógica das ações desenvolvidas no decorrer de uma prática desportiva já podem ser assimilada pelos alunos, porém, a plena assimilação dessa lógica, só ocorrerá através da experimentação dessas ações. Dificilmente ocorrerá a assimilação através de explanações e/ou explicações, por melhores e mais detalhadas que elas possam ser, ou seja, ela só é capaz de generalizar suas idéias a partir de uma ação concreta. Por exemplo, não adianta pedir para que ela execute um determinado tipo de passe que é melhor para aquela situação de jogo. Se ela não executar o passe e perceber as implicações da sua utilização, ela não irá atender ou terá dificuldade de atender à solicitação. O seu pensamento, baseia-se na realidade, nas ações concretas, ela apresenta dificuldades para pensar em situações hipotéticas.
Porém, ela é capaz de, ao observar determinados aspectos do jogo que já foram experimentados, associá-los a outras formas/situações, também já vivenciadas positivamente. Para melhor explicar essa situação, utilizaremos o exemplo do passe com sucesso numa determinada situação: esse êxito, experimentado, permite à criança, coordenar esses dois aspectos da situação (passe e sucesso) para obter novo êxito em uma situação análoga, em outro jogo.
Outro aspecto próprio das crianças nessa faixa etária, é a necessidade de "movimento" com atividades que oportunizem a descoberta e que exijam certa dose de coragem e ousadia, onde as crianças possam experimentar suas capacidades motoras, principalmente se desenvolvidas em ambientes coletivos, pois inicia-se a fase de comparações entre elas. Neste estudo, essas atividades são representadas pelos "jogos e brincadeiras".
Porém, esses jogos e brincadeiras, que para sua plena realização, de forma que oportunize as comparações, exigem regras bem definidas, que determinam noções de ética e moral (certo e errado) e o papel a ser cumprido pelos participantes (colaboração e cooperação), criam situações de aprendizagem que é "sui generes" para o aperfeiçoamento desportivo, pois ao mesmo tempo que cresce o desejo de compartilhar seu espaço com o outro, nos aspectos de colaboração e cooperação, tem claro para si a noção do acerto e erro dos seus parceiros, mas dificilmente observa seus próprios erros.
Por isso mesmo, o fato da criança não atender a todas solicitações imposta pelas regras para aquela situação ou atividade, ao mesmo tempo que exige do outro o seu cumprimento, advém da precariedade intelectual de sua experiência / conhecimento / vivência, para elaborar reflexões aprofundadas sobre causa e efeitos dessas regras, provocando, às vezes, desajustes e impertinências no desenvolvimento da atividade.
No início dessa fase (por volta dos 9/10 anos), essas contingências, aliadas a uma dificuldade muito grande de perder, que assume proporções dolorosas e frustrantes, a ponto de provocar, o choro, o abandono da atividade ou mesmo agressão, vai exigir do professor conhecimentos, para poder entender e prestar um apoio de maior qualidade a essa criança durante este período.
O conhecimento desses fatos, torna-se mais importante ainda, se levarmos em conta que, apesar dessas questões afetivas, esta é uma fase excelente para aprendizagem motora, segundo Weineck (1981), onde "... dever-se-ia prestar atenção[...] para que nenhum movimento erroneamente aprendido fosse 'automatizado', para que se evitasse o posterior 'desaprender' [e mais,] o que se perdeu (em termo de habilidades motoras), dificilmente [...] poderá ser recuperado" (p.258).
Assim, as atividades físicas desportivas a serem oferecidas nessa faixa etária, devem ter o intuito de: a) ampliação do repertório de movimentos dos fundamentos básicos dos diversos esportes coletivos, através dos educativos e dos contestes, com ênfase sobre os primeiros (pois as atividades lúdicas poderão ser satisfeitas através das atividades socializadoras) e; b) instrumentalizar as crianças com os elementos psicossociais que permitam a socialização e as ações cooperativas em grupo através de jogos e brincadeiras.
INTRODUÇÃO ao TREINAMENTO
IDADE DE 12 e 13 ANOS
Nesta faixa etária, a criança alcança significativo desenvolvimento da sua capacidade intelectual e física. Ela inicia a fase de pensar como adulto e isso significa que o professor pode esperar dos seus alunos, percepções similares às suas. O diálogo entre professor/aluno, torna-se mais maduro e consciente. Porém, essa fase, é caracterizada, também, pela crítica e pelo questionamento da autoridade, que pode levar ao distanciamento dos pais, professores e treinadores.
Ainda nessa fase (Introdução ao Treinamento), pela postura crítica e questionadora que o jovem ostenta, o grupo torna-se a medida de todas as coisas, assumindo uma grande responsabilidade no seu desenvolvimento sócio-cultural, a ponto de Weineck (1981) afirmar que, com a entrada na puberdade, apesar do interesse pelo esporte diminuir consideravelmente, ele se mantém interessante, pela oportunidade que oferece de estabelecer "...contato social com jovens da mesma idade".(p.260).
O grupo representa a segurança e o esporte o parâmetro de medida, pois seus pares possuem características físicas e emocionais similares às suas, criando com isso, espaços interativos que proporcionam oportunidades de desenvolvimento e avaliação (social, cultural, esportiva), sem grandes pressões e dificuldades para o relacionamento.
É, também, a partir dessa idade, que a criança/jovem torna-se capaz de compreender as regras (de discuti-las sob o prisma do "certo" ou do "errado") no sentido mais amplo (social, esportivo, etc.), pois percebe-a como fator condicional para que uma atividade possa ser praticada, por um grupo de pessoas. Isso significa dizer que essa compreensão, nas atividades recreativas, permite a modificação de uma determinada regra, quando esta é considerada "errada" ou "não conveniente para a atividade", para adequá-la às necessidades do grupo. Com isso, o grupo assume a responsabilidade pela condução da atividade (social e desportivamente), coisa que não é possível com a ajuda do professor / juiz, pois, segundo BENTO (op. cit.,), essa ajuda "... corporiza uma separação dicotômica entre o empenhamento corporal (contra alguém) e a responsabilidade social [onde é retirada] a possibilidade de testar pelo diálogo e em situações de conflito, [...] a validade das regras no sentido imperativo moral"(p.17-18).
É importante frisar, que nessa idade, as regras, modificadas ou não, são seguidas à risca por todos, pois representa os limites que cada um pode chegar dentro do grupo, uma espécie de organização informal ou quadro referencial que permite a ordenação e disciplina daquela atividade. Daí a importância do professor perceber que ao organizar uma atividade desportiva, ele o faz dentro de sua concepção de desporto, que é uma concepção adulta, que nem sempre é a mesma que a criança/jovem possui.
Por essas razoes, o esporte, mantém sua importância desde que se permita, segundo Weineck (1981), "...o direito ao diálogo democrático na formação do trabalho de exercícios esportivos e a participação ativa..." (p.260), como forma de garantir espaço e se possível, torná-lo o mais abrangente possível, à participação plena dos seus alunos nas atividades programadas, de modo a favorecer o fortalecimento da autonomia, da cooperação e da colaboração dentro do grupo.
A não observância desses fatos, pode provocar o planejamento de atividades desportivas calcadas nos moldes adultos, que acarretem "... limitações e exigências que contrariem os princípios do desenvolvimento da personalidade da criança."(BENTO, op.cit., p.25)
Outro fato concernente à atividade física nessa fase, diz respeito ao aumento de peso e altura, que apesar de provocar desajustes que vão incidir sobre a capacidade coordenativa, representa também, uma fase onde são melhoradas as capacidades de condicionamentos, pois o aumento da intelectualidade, permite a compreensão (conscientização) que "...possibilita novas formas de aprendizagem motora e da formação geral do treinamento." (Weineck, op.cit., p.261)
É, também, nessa fase, que o jovem apresenta uma forte necessidade de afirmação em todas as áreas em que atua. No esporte, essa tendência pode ser representado pela identificação com um determinado esporte, na busca de uma especialização.
Por isso, as atividades físicas desportivas a serem oferecidas para atender as necessidades dessa faixa etária, devem visar o aperfeiçoamento das qualidades físicas, as técnicas individuais e as táticas (individuais e coletivas) dos diversos desportos, através de preparação física e de práticas desportivas (jogos), onde a ação do professor oferecesse oportunidade para o desenvolvimento corporal e melhorasse o desempenho individual dos alunos.
Isso significa dizer, que o professor, enquanto adulto e profissional, mais desenvolvido intelectualmente, culturalmente e fisicamente, tem a responsabilidade de criar, através de atividades físicas adequadas (cargas) e diversificadas (motivadoras), condições que possibilitem às crianças / jovens uma aprendizagem individualizada, dentro do grupo, de modo a permitir solucionar impasses (conflitos), sem demasiada tutela.
QUESTÕES PARA REFLEXÃO
Ao levantarmos o assunto sobre Iniciação Desportiva na Escola, tivemos por intenção discutirmos a possibilidade de manter essa tarefa, sob o controle do Professor de Educação Física, até a idade de 13 - 14 anos, de forma que este pudesse preparar,essas crianças, para que, posteriormente, o Técnico Desportivo possa dar continuidade ao trabalho, através do treinamento específico.
Acreditamos que pode ser nessa fase da Iniciação Desportiva o momento do educador, ao possibilitar o despertar, segundo Bracht (1987), para uma nova maneira de perceber o esporte, evitando que o "princípio do rendimento, da competição discriminatória e do esforço pessoal e individual para vencer o adversário" seja utilizado como norteador principal desse novo enfoque, procurando "desenvolver um esporte em que se busca o jogar com e não contra o adversário..." (p.188). Um esporte onde a ação priorize a coletividade (não só os companheiros, mas, também, os adversários), dentro de uma nova perspectiva socio-esportiva.
Por outro lado, aproveitamos para levantar uma questão atual, para reflexão, de um aspecto crucial para a Iniciação Desportiva e o Treinamento, ambas consideradas tarefas conflitantes no âmbito da Educação Física, por tratarem em seu bojo, da competição esportiva. Essa questão refere-se à especialização precoce no treinamento infantil, cuja realização é feita através da proposição de atividades desportivas competitivas que, via de regra, são precedidas de rigorosos mecanismos de comportamento inadequado ao desenvolvimento infantil e, da adoção de treinamentos físicos e desportivos sistematizados, metódicos, visando a melhor performance esportiva, que tem provocado planejamentos inadequados, quer por excesso de carga, de repetições ou de exigências (legítimas ou supostas), impostas como deveres e obrigações, onde os princípios que regem o desenvolvimento físico, intelectual e psíquico ficam relegados a segundo plano. Devido às ações estandardizada a que são submetidas as crianças - pela premência física, técnica e tática exigida pela competição - são eliminadas e/ou dificultadas as atividades voltadas para a criação e a experimentação, tão necessárias para aprendizagem e assimilação dos conhecimentos, além da plena sensação de satisfação individual, sem a qual advém o desestímulo, que pode provocar o afastamento do aluno das atividades desportivas.
E, para finalizarmos, não poderíamos esquecer que ninguém pode dar conhecimento a outrem, ele deve ser descoberto e construído na prática diária, nas ações realizadas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, L.T.P. Planejamento Participativo: uma experiência no curso de formação de professores de Educação Física - um caso em handebol de salão. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE GINASTICA. 11°., 1990, Pelotas - RS. Texto mimeo Pelotas - RS: UFEPel - ESEF, 1990.
BENTO, J.O. A criança no treino e desporto de rendimento. Revista Kinesis. Centro de Educação Física e Desportos. Universidade Federal de Santa Maria: Santa Maria, V.5, n.1, p. 001-160, Jan-Jul 1989
BETTELHEIM, B. Uma vida para seu filho. Rio de Janeiro: Campus, 1988.
BETTI, M. Ensino de primeiro e segundo graus: Educação Física para quê? Revista Brasileira de Ciências do Esporte. São Paulo, v.13, n.2, 1992.
BRACHT, V. Educação Física e aprendizagem social. Porto Alegre: Magister, 1992.
CHARLES, C.M. Piaget: ao alcance dos professores. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1975.
DOLLE, Jean-Marie. Para compreender Piaget: uma iniciação à psicologia genética piagetiana. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975.
GUIRALDELLI JUNIOR, P. Educação Física Progressista: a pedagogia crítico-social dos conteúdos e a educação física brasileira. São Paulo: Loyola, 1989.
HERNANDEZ, A.J. Problemas da atividade física precoce. Revista Movimento. São Paulo, Ano 3, n. 3, 1993. p. 22 - 27.
NAHAS, M.V. A competição e a criança. Revista Comunidade Esportiva. Rio de Janeiro, n. 15, Jul/Ago 1991. p. 2 - 5.
OLIVEIRA, V.M. Educação Física humanista. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985.
PIAGET, J. Seis estudos de psicologia. Rio de Janeiro: Forense Universitária Ltda, 1980.
PINTO, L.M.S.M. A recreação/lazer no "jogo da Educação Física e dos Esportes. In: MONTANDON, I. Educação Física e Esportes nas escolas de 1° e 2° graus. Belo Horizonte-Rio de Janeiro: VILLA RICA, 1992. p. 25-36.
VEREZA, L.S. Interação Professor-aluno. Revista Escola para Professores. São Paulo, n. 5, p. 20-23. Editora Abril, jul. 1972.
Conheça os Manuais para Professor de Educação Física
Tenha Atividades para Aulas de Educação Física
Trabalhe com Educação Física
Segue no Instagram!
Receba nossos links no Telegram e no Whatsapp .
Post a Comment